Exposição de longa duração

Os móveis e utensílios que compõem o acevo do museu retratam aspectos sociais e culturais ligados ao trabalho e à vida doméstica, refletindo o cotidiano de algumas famílias alcantarenses entre os séculos XIX e XX.

A atual exposição de longa duração do museu aborda as atividades comerciais que funcionaram no prédio, informações sobre os últimos proprietários e aspectos históricos revelados a partir de móveis e objetos que integram o sobrado. Enquanto no pavimento inferior pode-se conhecer a sala das atividades comerciais, no pavimento superior estão distribuídas a sala da família Guimarães, sala dos utensílios domésticos e de usos pessoais, vitrines temáticas, sala dos móveis de guarda e sala dos móveis de descanso e repouso.

Sala do Comércio

A parte inferior deste sobrado, seguindo o modelo brasileiro do século XIX, era dedicada ao comércio. Aqui funcionavam um armazém, onde se comercializava um pouco de tudo, de tecido a cereais, uma botica e um banco. A botica foi instalada entre 1880 e 1890 e tinha como principal função manipular e vender remédios e essências. Os medicamentos eram preparados pelo boticário/farmacêutico João Victal de Mattos e pelo patriarca da última família que residiu no casarão: Antonino Guimarães. Estes eram feitos com ervas medicinais e produtos químicos do Brasil e importados da Europa – França, Alemanha, Espanha. A farmácia fechou em 1947, ano em que o seu proprietário – Antonino Guimarães, faleceu.

O sobrado também abrigou uma espécie de banco, na medida em que o senhor Antonino Guimarães fazia empréstimos através de hipoteca. Além das atividades econômicas desenvolvidas no interior do sobrado, destaca-se que a família Guimarães também possuía algumas fazendas de sal na área rural de Alcântara.

Escadaria

Os painéis de azulejos ao longo da escadaria não são da construção original da casa. Foram adquiridos pela última família de proprietários, que os preservou até a desapropriação do imóvel. São peças de origem europeia feitas à mão.

“…constitui-se numa variante de azulejos portugueses de
finais do século XVIII, bastante difundidos em Portugal e no
Brasil como revestimento externo.” (INBMI fichas 886/889).

Embora a presença dos azulejos em Alcântara seja uma herança portuguesa, a origem é oriental. Foi introduzida pelos árabes inicialmente na Espanha e posteriormente difundiu-se por toda a Europa, contudo exerceu maior influência na Espanha e em Portugal.

Sala dos utensílios domésticos e de usos pessoais

Enquanto no pavimento inferior do sobrado funcionavam as atividades comerciais, o pavimento superior era a residência da família. Nesta casa os serviços domésticos eram realizados por serviçais, escravos ou não, poupando as senhoras das atividades mais sujas, pesadas e degradantes.

Já alguns objetos de uso pessoal revelam aspectos sociais e culturais da época

O pote era um objeto muito utilizado para transporte e armazenamento de água até o século XX, cujo período marca também o surgimento do filtro de barro no Brasil. Este foi desenvolvido por imigrantes europeus que chegaram em São Paulo e já possuíam as velas de filtragem da água. Eles adaptaram a cerâmica utilizada para fabricar potes na criação do filtro. Em Alcântara, como no interior do Maranhão em geral, o filtro de barro ainda é um objeto muito presente nas residências.

Em um passado não muito distante, engomar roupas era uma atividade própria do universo feminino e eram “exaustivas e demoradas”. Um ferro aquecido com brasas pesava entre três a cinco quilos. Para que o serviço fosse feito com rapidez e eficiência, era preciso que a dona de casa contasse com três ferros; um terno de linho exigia, para ser passado sem interrupção, pelo menos cinco ferros previamente aquecidos”.

Na cidade de Alcântara, que só teve fornecimento regular de energia elétrica a partir de 1989, as atividades domésticas tiveram que continuar a ser feitas como se fazia nos séculos precedentes, sem que se pudesse contar com as inovações tecnológicas que facilitavam a vida das donas de casa de outras regiões, como o ferro elétrico, a máquina de lavar roupas, etc.

Quando surgiu, o sapato era uma peça de vestuário que possuía a finalidade de proteger os pés, mas esta peça transcendeu essa finalidade nos dias atuais e serve como adorno e acessório de moda, tendo também uma função social.

O sapato feminino visualizado na vitrine representava no passado uma pequena ousadia. Antes deles, usavam-se as antigas botinas, cujos canos altos, associados às longas barras das saias, impediam a visão de qualquer nesga de pele que fosse. Este modelo, que substituiu as botinas, concedia à visão alheia alguns centímetros da pele daquela que o usasse.

Como o habito do banho não era tão usual, perfumes, loções, águas perfumadas e pomadas especiais eram usadas nas atividades de higiene do corpo. A fumigação (produção de fumaça, geralmente a partir de produto odorífero, como alfazema) era vista como medida de higiene doméstica.

Algumas mudanças culturais podem ser observadas a partir das armas. Das espadas e armaduras, que eram extensões do corpo do guerreiro, otimizando suas capacidades físicas, valorizando-o individualmente, passa-se às armas de fogo, que marcam a ascensão dos processos industriais e inauguram um novo padrão de organização bélica. O conjunto de armas de fogo e munições nesta sala datam do início do século XX e pertenceram ao comerciante e tenente coronel Antonino Guimarães.

Varanda e vitrine

Cerâmica

A cerâmica é utilizada tanto na construção civil quanto no cotidiano, servindo para a construção de telhas e tijolos, como também para a confecção de utensílios domésticos para armazenamento e consumo de água e de alimentos. É o material artificial mais antigo produzido pelo homem. Quando saiu das cavernas e se tornou um agricultor, o homem encontrou a necessidade de buscar abrigo, mas também notou que precisaria de vasilhas para armazenar água, alimentos colhidos e sementes para a próxima safra.

Tais vasilhas deveriam ser resistentes, impermeáveis e de fácil fabricação. Estas facilidades foram encontradas na argila, deixando pistas sobre civilizações e culturas que existiram milhares de anos antes da era cristã. São frequentemente encontradas em escavações arqueológicas. As mais antigas datam de 8.000 anos A.C. No Brasil estudos arqueológicos indicam que a cerâmica tem seus primórdios na região amazônica e na Ilha de Marajó. Dessa forma, a tradição ceramista não chegou ao Brasil com os portugueses ou na bagagem cultural dos escravos, como muitos acreditam, e sim com os índios. O processo empregado pelos indígenas, no entanto, sofreu modificações com as instalações de olarias instaladas pelos portugueses.

Em Alcântara o trabalho artesanal com a cerâmica faz parte do cotidiano de algumas comunidades remanescentes de quilombos, sendo a mais conhecida a de Itamatatiua que possui inclusive um centro de produção.

Iluminação pública

A forma e o princípio de funcionamento dos equipamentos empregados na iluminação mudou pouco até o século 18. A lamparina pré-histórica encontrada na Gruta de Lascaux, na França, funciona da mesma forma que as lâmpadas orientais da Idade Média, assim como se assemelha aos candeeiros empregados nas casas dos colonos dos três primeiros séculos de história do Brasil. Os candelabros e castiçais que amparavam velas eram feitos de materiais diversos. Nas casas mais nobres, existiam candelabros de bronze e prata.

No século 19, com a Revolução Industrial, aparecem equipamentos sofisticados, como os lampiões a querosene e as luminárias que, além de serem ricamente decorados, permitiam a regulagem da intensidade da chama; guarnecidos de mangas de vidro, podiam ser usados em áreas abertas, pois não temiam o vento. Os lampiões fabricados industrialmente, como os da marca Coleman (EUA) e Petromax (Alemanha), permanecem em uso até os dias de hoje, servindo a pescadores, campistas e caçadores.

A Iluminação artificial dos espaços públicos iniciou-se no século 18 no Brasil. A cidade do Rio de Janeiro, então capital do Reino, foi a primeira a contar com o serviço, que surgiu no ano de 1794. No Maranhão, o serviço de iluminação pública começou em 1825, por meio da instalação de lampiões abastecidos com óleo de mamona. Em 1854, passou-se a empregar o álcool como combustível.

Esse sistema de iluminação era bastante criticado pela população, que se queixava do número pequeno e da falta de manutenção adequada dos lampiões. Devido à fuligem que se impregnava nos vidros, a luminosidade ficava ainda mais baixa.

A iluminação pública de Alcântara começou a ser efetuada em 1846, por meio do cumprimento de uma lei criada pela Assembleia Provincial; a cidade recebeu 20 lampiões e o governo Provincial passou a custear a manutenção dos mesmos. De acordo com documentos que encontramos, o sistema de iluminação por lampiões durou até 1957, quando houve a instalação de um gerador de energia elétrica na cidade. Somente em 1989 que a cidade de Alcântara passou a ser abastecida regularmente com energia elétrica.

Higiene e limpeza

No início do século XIX, as atividades de limpeza corporal eram simples, reduzidas à lavagem de algumas partes do corpo, como os pés. Viajantes que passaram pelo Brasil naquela época deixaram registros de seu espanto com a falta de hábitos de higiene mais completos.

Por volta de 1860, cada pessoa dispunha, em média, de 12,5 litros de água por dia, para todas as atividades necessárias à vida (beber, cozinhar e cuidar da limpeza do corpo). Atualmente, cada pessoa gasta em média 40 litros diários apenas com a higiene pessoal. No entanto, a distribuição de água é e sempre foi desigual entre os grupos sociais e entre os países do mundo.

Na cidade de Alcântara, as pessoas recorriam às fontes públicas para o abastecimento de água. Famílias ricas tinham poços nos fundos de suas casas, o que facilitava o trabalho de coleta de água. O sistema moderno de abastecimento de água chegou à cidade na década de 1980.

Os urinóis se popularizaram no século XIX, tornando-se parte dos utensílios básicos das casas. Se hoje parecem desconfortáveis e incompatíveis com as noções de comodidade e higiene, representaram, no momento em de sua disseminação, uma etapa no processo de privatização das rotinas do corpo, que antes eram realizadas publicamente, em toda parte.

Já as escarradeiras, disseminadas na Europa entre os séculos XVI e XVIII, eram vistas de início como prática necessária e salutar, forma de expelir do organismo as secreções nocivas. O ato de escarrar era publicamente tolerado e praticado, e dessa maneira as escarradeiras se tornaram presença obrigatória nas salas e escritórios de casas nobres, incluindo as colônias europeias. Com o avanço dos conhecimentos da microbiologia, o ato de escarrar passou a ser mal visto, considerado anti-higiênico, por conta do potencial de propagação de microorganismos, especialmente do bacilo de Koch, causador da tuberculose. Os médicos, principalmente, passaram a combater sistematicamente o hábito.

Sala dos móveis de guarda

Os primeiros móveis de guarda que surgiram foram os baús e arcas. Inicialmente simples e rústicos, executados com escassa preocupação estética, baús, caixas e arcas eram móveis que tinham alma de viajante: estavam sempre prontos para o deslocamento. Essa ambivalência tornava-os populares, necessários, úteis. Os mesmos eram utilizados para guarda de objetos, como malas, cadeiras e mesas.

Com o tempo, a colonização se estabilizou espacialmente e os móveis de guarda ganharam em peso e tamanho, perdendo o ímpeto peregrino. Ganharam mais compartimentos, gavetas, escaninhos e passaram a ser decorados com um esmero que os tornava mais do que meros utilitários. Destinavam-se também a impressionar, conferindo nobreza aos seus proprietários.

Assim, surgiram as cômodas, penteadeiras e guarda-roupas. Uma curiosidade é que os armários inicialmente constituíam móveis de guarda de armas, especialmente espinguardas, passando a assumir outras funcionalidades posteriormente.

Já outro destaque na sala é o contador, o qual era utilizado para transações comerciais. Assim, apresenta vários compartimentos com fechaduras, sendo alguns escondidos. Existiam os contadores de uso mais privativo, como o que se encontra nesta sala, e modelos que eram usados no contato com o público, como o contador da sala das atividades econômicas.

Além dos baús, malas, armários, guarda-roupas, guarda-louças e cômodas, encontra-se nesta sala um guarda comida. O próprio nome indica o uso, mas o fato interessante é que as telas de proteção existentes possibilitavam a conservação dos alimentos por umas poucas semanas, algo impensável até o seu surgimento. É bom lembrar que as comidas eram consumidas imediatamente, pois estragavam rapidamente. Há quem diga que o guarda-comida é o predecessor da geladeira.

Sala dos móveis de descanso e repouso

Antes do surgimento das camas o homem dormia no próprio chão. A necessidade de se proteger de animais rastejantes, peçonhentos, o desconforto, entre outras desvantagens acarretaram no surgimento desse objeto. Os registros mais remotos do uso das camas constam nas civilizações egípicia e mesopotâmica. Na civilização romana o uso de camas semicirculares ao redor das mesas servia também para as refeições, remetendo muitas vezes a um objeto de uso coletivo e de socialização. Foi somente na idade média que as camas passaram a ser colocadas em aposentos mais privados, como os quartos. Já a configuração íntima e a conotação particular foram assumidas somente no século XIX. As camas de ferro começaram a ser produzidas a partir do século XVIII com a vantagem das pessoas poderem descansar sem incômodo dos insetos.

Além da cama, um objeto importante e muito usado no Brasil para dormir e descansar é a rede, sendo este termo próprio do Brasil. Provavelmente tal nomeação foi adotada devido à semelhança com a rede de pescar. Na América Espanhola era conhecida pelo nome hamaca. O nome primitivo e termo indígena era INI que se trata de uma criação indígena, porém há divergências quanto à nação que originou. Alguns estudiosos atribuem aos índios Caraíbas e outros à nação indígena Aruaque. As primeiras redes eram feitas com fibras de palmeiras e cipós, sendo a utilização do algodão posterior.

Além da função de descanso, a rede possuía outras funções: servia de sofá e cadeira; meio de transporte e no enterro. Tanto nas casas mais ricas, como nas pobres a rede estava presente e no período colonial tanto a cama como a rede eram fatores de diferenciação social. É importante destacar que o hábito de dormir em redes é mais comum nas regiões de clima quente (norte/nordeste) do que nas de clima frio (sul/sudeste). Outro fator que determinou a maior ou menor presença da rede foi o contato e proximidade que os habitantes tiveram com os índios.

Além da cama e da rede, as esteiras, catres e jirais (espécies de espreguiçadeiras) também foram objetos de dormir e descanso em épocas passadas.

Vista da Praça da Matriz a partir do mirante do museu
Vista da Praça da Matriz a partir do mirante do Museu

Mirante

O mirante é o último pavimento do sobrado. São atribuídas várias funções a este espaço: era utilizado para isolar pessoas doentes, receber caixeiros viajantes, visualizar a chegada de embarcações, servir como depósito, entre outros usos. A partir do mirante do museu visualiza-se a praça Gomes de Castro, também conhecida por praça da Matriz, onde era o centro de poder da cidade com a antiga Casa de Câmera e Cadeia (atual prefeitura), a igreja de São Matias (antiga matriz) e o pelourinho.

Obrigado pela visita, volte sempre!

Oferecemos visitas mediadas gratuitas ao acervo de terça a domingo. Para grupos maiores favor agendar pelo telefone (98) 3337 1515 ou pelo email mcha@museus.gov.br.

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